sexta-feira, 4 de janeiro de 2008




FUZILO


eu fuzilo corações, beijos e perdões
fuzilo o chão mal posto
fuzilo quem inadvertidamente me persegue
fuzilo o sol que me bronzeia
fuzilo a hóstia da igreja que
implacavelmente promove forró e
cachaça
fuzilo cabeças
fuzilo a mim mesmo, também
quando inadvertidamente me correspondo
com vibrações antagônicas, arruinando o
meu coração já tão rôto
fuzilo, também, feiras, sextas e prenúncios de verões
fuzilo quem me apunhala pela frente
fuzilo vizinho, parentes e incógnitas
fuzilo espelhos
fuzilo o dia, a hora e os segundos da minha
vida largada
largada feito um fuzil
enferrujado
fuzilo também avenidas desertas
fuzilo padres, advogados e dentistas
fuzilo jornais, chocolates e serpentes
fuzilo o chão indócil que me abriga
fuzilo anzóis, anéis e a cartomante que me benzeu
fuzilo o til, tremas e pretéritos ácidos
corroendo como ônibus de fim de linha
loas, lendas e leões
fuzilo abrigo, chuvas e topetes
fuzilo o preto que me dá sombra e some
fuzilo o ar,
fuzilo o mar,
fuzilo o lar
fuzilo a broa
fuzilo haikais
fuzilo amores, sabores e favores
fuzilo a sombra do ontem
e o cheiro do amanhã
fuzilo flores
fuzilo dores
fuzilo cantores
fuzilo o juízo carnal
todos os banheiros, todos os ponteiros,
todos os travesseiros
fuzilo o véu de quem cobriu promessas
fartas
fuzilo balsas, a festa falsa
fuzilo a cor, a morte, o divã
fuzilo a minha fã, a minha iansã, a vontade
de correr, de sofrer, de colher e de arder no
purgatório de palavras e silêncios
fuzilo canções
fuzilo a mente, a gente e o demente
fuzilo juízes, ouvidores e os atores
fuzilo o transe de um hospital imaginário
fuzilo a vertente de sangues, do blues, do
chão e das reuniões impróprias
fuzilo a lua e os seus amores
fuzilo o rio e os seus senhores
fuzilo o fim e os seus sabores
fuzilo a noite e os seus favores
fuzilo estrelas, espaçonaves e baiões
fuzilo o quilo da maconha e do feijão
o remédio que engrossa a voz
e bloqueia as vias inspiratórias
fuzilo a estrofe, reis e rainhas, as colheitas
e as parlendas
fuzilo o espelho, o conselho, o novelo
fuzilo sons
fuzilo sanfonas
fuzilo o meu rosto
fuzilo o entreposto de produtos siderais
fuzilo a vazante do riso
rôto como alegria de um circo sem empanada
fuzilo frutas, geléias e fardas bandidas
fuzilo o nome, a grafia, o non sense
a face do apito final
fuzilo ramalhetes, bilhetes e sorvetes
fuzilo chicletes, baurets e trompetes
fuzilo o só
fuzilo o pó
fuzilo o dó
fuzilo a força de quem tem grana
fuzilo carro zero
fuzilo a cancela
fuzilo juízos e javalis
fuzilo o pato e o concriz
fuzilo aniversário
fuzilo invenções
fuzilo o armário
fuzilo ilusões
fuzilo portas, partes e pendões
fuzilo o botequim, o manequim, o chinfrim
fuzilo covardia
fuzilo a sombra que voce mesmo salvou
fuzilo o resto do que ficou da canção daquele dia
que os beijos sentiram a despedida de dois mundos diferentes
fuzilo a falta do nada
fuzilo a idiotice do fácil
fuzilo a mim
como quem fuzila o sim
eu sou o fim

Cgurgel

Um comentário:

Khrystal disse...

nossa gugú..que incrível!!
tô fuzilada..
ô poeta da porra!!

bjus