segunda-feira, 27 de abril de 2009


BENDITO CRAZY

Um bocado de psicodelia, com um tanto de mod, uma xícara de jovem guarda, um litro de tropicalismo, duas colheres de sopa de folk, mais um pouco disso e daquele outro, numa mistura de Beatles, Mutantes, Syd Barret (Pink Floyd), Tom Zé, Kinks, Caetano, Dylan, João Gilberto... Coloque tudo numa forma nascida em Porto Alegre, no dia 26 de janeiro, de 1968 e deixe amadurecer até os anos 90 do século XX da era cristã. O resultado é um ser inusitado chamado Jupter Apple, que já foi Júpiter Maçã, antes Woody Apple (Ops, não é parente meu não!), mas que foi batizado como Flávio Basso e hoje voltou a ser chamado de Júpiter Maçã. Estranho e metamórfico cujo trabalho musical (nas horas vagas ele, também, se aventura como cineasta) mistura todos os ingredientes citados acima, tendendo mais para um estilo ou para outro, sendo ora uma coisa, ora outra, ora nenhuma, nem outra. Complicado né? Neste caso a máxima de Tom Zé cabe muito bem: “eu to te explicado que é para te confundir, eu to te confundindo para te esclarecer”.
O nosso cítrico amigo tem história nas trilhas do rock gaúcho com passagem pelo TNT (anos 80) e no Cascavelletes (1987 – 1991). Depois disso, Flávio Basso adotou um estilo folk e saiu perambulando por ai sob a alcunha de Woody Apple, com violão e gaitinha no melhor estilo Bob Dylan. O Apple é uma referência aos Beatles influência marcante na sua formação musical. Já o Woody, eu não me lembro de ter lido ou ouvido alguma explicação dele a esse respeito, mas a julgar pelo estilo adotado só pode ser uma menção à Woody Guthrie (1912 - 1967), considerado um dos nomes mais importantes da folk music norte-americana e uma grande referência na música de Bob Dylan. Após essa breve incursão nesse universo folk, o nosso herói tira o Woody do nome e passa o Apple para o português, se intitulando Júpiter Maçã, gravando, em 1995, sua primeira demo com a banda Os Pereiras Azuis (futura Cachorro Grande). Essa demo já contava com futuro clássicos como “Lugar do Caralho”, regravada anos depois por Wander Wildner (Ex-Replicantes) e “Miss Lexotan 6mg Garota” que recebeu uma versão do Ira!.
Finalmente em 1997, ele lança seu primeiro disco solo, A Sétima Efervescência, que é calcado nos moldes de The Piper At The Gates Of Dawn, do Pink Floyd, com psicodelia e experimentação (e, por um leve momento, um prenúncio de sua obra ulterior, o final de "Sociedades Humanóides Fantásticas", uma bossa-nova psicodélica). As músicas desse disco são grandes referências do rock gaúcho. Contém algumas faixas fixadas no imaginário underground, como "Querida Superhist X Mr. Frog", "As Tortas e as Cucas", além das já citadas “Lugar do Caralho” e “Miss Lexotan 6mg Garota”. Após experimentar um relativo sucesso com o lançamento desse disco, torna-se Jupiter Apple, compõe em inglês, e decide misturar bossa-nova e vanguarda. Muitos fãs não o entenderam, preferindo a psicodelia "simples" do trabalho anterior. Essa mistura inusitada está muito bem feita no seu segundo disco, Plastic Soda (1999). Ele começa com uma canção de nove minutos, "A Lad And A Maid In The Bloom", que define o caráter inovador do disco.
Em 2002 é lançado Hisscivilization, o disco mais ambicioso (talvez incompreendido) de Jupiter Apple. Longas experimentações eletrônicas (destaque para "The Homeless And The Jet Boots Boy"), bossas elétricas e lounge, valsa, cítaras e MOOGs, condensados em momentos, ora de leveza, ora de paranóia. É seu disco mais hermético: se, para os que estavam acostumados com o rock and roll dos Cascavelletes, a Sétima Efervescência já era algo inesperado (psicodelia em doses cavalares), a reação causada pelos dois discos da fase Apple são ainda mais dramáticas.
Em 2006 era esperado o lançamento do disco Uma Tarde Na Fruteira, que acabou saindo somente em 2007, com uma edição especial lançada na Espanha, aonde recebeu ótimas críticas. Nele, o Apple volta a ser Maçã, mas continua explorando o lado brasileiro e experimental, com músicas já eternizadas no subconsciente do underground porto-alegrense, como "A Marchinha Psicótica de Dr. Soup". Esse disco pode ser considerado o mais acessível do autor. De certa forma, tudo que já foi composto pelo Júpiter está resumido neste trabalho: desde canções mod sessentistas, levezas jazz, baladas domingueiras e “bob-dylantescas”, concretismos e timbres eletrônicos.
Ainda no ano passado, as músicas do Júpiter Maçã rechearam a trilha sonora de Wood & Stock - Sexo, Orégano e Rock’n Roll, animação em longa metragem do cartunista paulista Angeli. Ele também lançou o álbum Jupiter Apple & Bibmo, pela Monstros discos, de Goiânia, com participações especiais no mínimo lendárias de: Prego (da Pata de Elefante) e Márcio Petracco (dos Locomotores). Isso, mais o fato do lançamento no velho mundo, talvez ajudem a trazer essa Maçã para um lugar ainda mais ao sol, porque apesar de tudo, Júpiter continua orbitando pelo underground e merecia um destaque maior, apesar da sua música ser um tanto retrô, lembrando uma série de referências do passado, essa velha receita ainda é muito melhor que muita coisa nova que está rolando por aí, principalmente se falarmos em termos de rock nacional aonde, com raras exceções, impera um pop (muito mais que um rock) recheado de mediocridade e intenções meramente comerciais.

( http://boogiewoody.blogspot.com/ )

Um comentário:

Anônimo disse...

Ótimo texto, muito bem escrito. é uma pena um músico como este não ter o merecido reconhecimento. Mas talvez não seria tão extraordinário se fosse de outro jeito...

Pedralha